Início da década de 50. A casa que o avô Américo queria comprar, uma casa contígua àquela em que vivia, juntamente com mulher, três filhos e três cunhados, custava treze mil escudos. Treze contos, na linguagem financeira que dominou o século XX português. Era uma casa simples, com dois quartos, chão em tábuas de madeira, que partilhava uma parede com a residência de uma ou duas vacas de respeitável porte. Hoje, essa corte - designação da residência bovina - está vazia, mas ainda me lembro de, em criança, ser acordado pelo mugir impaciente das criaturas.
Para conseguir o dinheiro, o avô Américo decidiu emigrar para o Brasil. A viagem fazia-se pelo mar, durava cerca de um mês e custava pouco menos de seis mil escudos. Seis contos. Pediu o dinheiro emprestado para a viagem. Haveria de o devolver, com juros. O Brasil haveria de lhe dar essa oportunidade, oferecendo-lhe um salário de quarenta escudos por dia. Quarenta paus, depois de bem calculado o câmbio do cruzeiro, moeda oficial do Brasil naqueles tempos. Que trabalho pagava 40$00 por dia? O de calafate. Passar o dia a raspar soalho, piso de madeira, para depois vedar eventuais falhas entre os tacos de madeira, atividade certamente bem marcada por intervalos regados a chopinho. Acredito que o avô Américo gostasse de cerveja.